Uma mulher sombria percorria uma calçada estreita e comprida, segurando uma pasta na mão.
A sua indumentária era certamente excêntrica. Trajava de couro negro, da cabeça aos pés.
As suas feições estavam quebradas pela negrura tenebrosa de uns óculos de massa negros. Atrás dos mesmos, porém, uns olhos verdes, muito claros, marcavam a diferença de toda a sua figura.
Era branca como neve e os seus lábios estavam pintados do mais delicioso tom de encarnado.
Também o seu cabelo era negro e comprido, tão comprido que lhe roçaria a cintura tirado o pesado casaco que envergava.
A figura descia a rua num passo apressado, sem nunca parar. Aqui e ali dava sinais de inquietude, para logo de seguida se soerguer, como se nunca houvesse hesitado.
Trinta metros atrás dela, tentando o mais possível ser discreto, a figura de um homem recortava-se contra o sol luminoso.
Parecia que ela já se tinha dado da conta da sua presença, porém a rua estava deserta e o homem era, sem dúvida, brilhante na sua função.
Percorreram mais trinta metros neste vaivém de vontades, até que o homem tropeçou numa pedra que rolou pela calçada e tocou, ao de leve, no calcanhar da mulher.
Esta estacou, levantou os olhos belos ao céu e silvou três vezes.
A expressão do seu prossecutor mudou drasticamente, parecendo agora de temor. Então, o seu corpo foi violentamente levantado e sacudido no ar, como uma marioneta presa por fios invisíveis.
Terminou então o grotesco espectáculo.
Já não se distinguiam as suas feições, a sua face estava estranhamente alterada. Onde houvera olhos existiam agora duas fendas, disformes, e a íris estava raiada de um vermelho-sangue.
Os seus lábios estavam unidos por várias linhas de carne como se cosidos entre si e os seus braços repousavam esticados no ar, como que crucificado contra uma cruz que não existe mais.
A mulher sorriu então, linda, e proferiu outras palavras que não houvera proferido até aí. O cadáver irrompeu então em chamas, espalhando cinzas no vento.
O seu senhor ficaria satisfeito com este serviço.
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